segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Pedaço de um passado

Desde criança que a minha curiosidade tinha sido aguçada, por ouvir contar  ás pessoas mais velhas, que havia pessoas que se distanciaram da aldeia de Canavezes, preferindo viver na mais profunda solidão, na altas serras. De facto sempre assim foi, a historia conta-nos que sempre houve pessoas, que preferiram o contacto ainda mais próximo com a natureza do que o burburinho das pessoas.
A razão não se sabe, os tempos eram diferentes, havia mil razoes para o fazer e para não o fazer, viver solitárias no profundo vale, porque?
È aqui que entramos no bucolismo e no arcadismo, termos utilizados para designar uma espécie de poesia pastoral, que descreve a qualidade ou o carácter dos costumes rurais, exaltando as belezas da vida campestre e da natureza. "o mito do homem natural em oposição ao homem corrompido pela sociedade"

Pois bem, há muito tempo que sentia esta necessidade de ir investigar. Foi então que resolvi, subir á serra e ir visitar a chamada fraga da toca  e a "casa" do misterioso homem que viveu perto da aldeia do castelo, sozinho, com o seu cão e o seu burro. 
Vista superior - Fraga da toca
O nome Fraga da Toca deriva do facto de este aglomerado de pedras de origem natural conter uma cavidade natural rochosa com grandes dimensões que permitia o acesso aos seres humanos. O seu desenvolvimento é vertical e o interior possui sete a dez metros quadrados. 

Á primeira vista supõem se que poderia ser usada como abrigo natural, mas no interior da caverna não existe qualquer indicio de presença humana. 
Mesmo assim, devido a verticalidade do terreno, é de ainda de difícil acesso para aceder ao seu interior.
O orifício de entrada é originário de uma série de processos geológicos que podem envolver uma combinação de transformações químicas, tectónicas  biológicas e atmosféricas sobretudo, até porque não sou geólogo, não posso afirmar nem apresentar grandes argumentos.
        Devido às condições ambientais exclusivas da caverna, pode dizer-se que é considerado um verdadeiro ecossistema. Outros animais, como os morcegos, podem transitar entre seu interior e exterior.


O principal motivo para que a fraga da toca não tenha sido "escolhida" para habitação, são principalmente pelo seu difícil acesso já referido e também por causa da extrema humidade, pois basta uma vista rápida para perceber que no tempo de chuva a caverna não é o sitio mais confortável para viver. O facto de se situar no cimo de um pico de um monte, faz com que os fortes ventos de inverno, se façam incidir. 

Ainda assim consegue-se perceber "manchas" causadas pelo fumo, podendo dar  a impressão que eram causadas pelas fogueiras que se poderia ter acendido no interior da caverna, mas na verdade essas manchas foram causadas pelo incêndios ao longo dos anos. 
A caverna é suficientemente húmida, e de inverno pode ser dificil acender uma fogueira sequer,  o vento também ajuda a que se torne uma quase missão complicada.
O Interior? bem no interior a vista é espectacular. Apetece mesmo lá viver. Acredito que em dias em que a paisagem não tenha sofrido com os incêndios, a vista seria ainda mais gloriosa. 
Posso então dizer que apesar do nome "toca" apelar á imaginação que possa ter ter servido de abrigo alguém, de facto pelas razoes já mencionadas isso não possível.
De facto nem há qualquer sinal ou indicio que os animais poderiam utilizar como casa, dai reforça a minha ideia.
 O interior apresenta uma fauna especializada para viver em ambientes escuros e como é o caso dos morcegos, com vegetação nativa (fentos) e líquenes (musgos) dando estes indicio de humidade, que escorre da parte superior. 


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Continuamos a caminhar em busca da caverna que abrigou o homem cujo ninguém sabe o nome.
A primeira vez que visitei este local estava á espera de encontrar uma caverna típica  utilizada na idade remota, como ambiente seguro e moradia para o homem primitivo, estava á espera de encontrar uma imensa variedade de evidências arqueológicas e pura arte rupestre ou então algo ligado á "cerca dos mouros" não muito distante deste local. Poderão ler aquihttp://canavezesaldeia.blogspot.pt/2013/02/cerca-dos-mouros-canaveses.html

A enorme quantidade de matéria prima, dizia-me que este sim, seria um sitio ideal para a morar. A vegetação camuflava muito bem a gruta, isso agora já não acontecia devido ao impacto do recente do incêndio.
Pormenor da parte superior da caverna.

Do outro lado do vale é possível visualizar aglomerados de pedras, que indicam actividade agrícola, sendo que a hipotse de a caverna pertencer ao paleolítico começava a ser descartada. Talvez sim a uma era bem mais recente.
Finalmente a chegada!! O sitio é remoto pois fica no fundo de um regato ou de um vale como preferirem, com fácil acesso a um pequeno ribeiro que nunca seca, a terra é propicia á agricultura. O local ideal para se viver.

A arquitectura é básica, foi acrescentada á condição geológica natural , duas paredes pensadas.
A caverna foi inteligentemente escolhida pelo seu habitante, esta zona particular é fresca de Verão e uma fogueira de Inverno era suficiente para se viver confortável.
O risco de cheia ou enchente, não representava um perigo, ate porque é aqui neste vale que nasce o rio que vai ate Canaveses. Por isso o leito do rio aqui nesta zona em particular, nunca chega a aumentar significativamente.

 No entanto o leitor irá desconfiar que esta caverna não foi usada como habitação, irá dizer que é apenas uma "casuca" usada pelas pessoas para se abrigarem quando, á chegada das chuvas enquanto andavam a trabalhar. Mas existem uma série de evidências arqueológicas que provam que foi de facto um local de habitação.
Já no interior o que salta logo á vista é uma espécie de banco que servia para alguém se sentar ou mesmo deitar. É um ambiente único, em que não ao centro, mas ligeiramente na parte sul se localizava a fogueira, que servia para aquecer e também para cozinhar. Conta com uma abertura na cobertura que servia como chaminé, respiradouro e acesso. No entanto é aqui que reside uma reflexão, se não fosse para passar bastante tempo o suficiente, haveria a necessidade de construir este bancos? - porque caso contrário, para passar pouco tempo, a própria caverna já oferecia saliências para se sentar, mas menos confortavelmente.

A própria zona da fogueira tem alguma erosao causada pelos sucessivos fogos, 
Há um elemento sempre presente, nos locais, desde que o homem aprendeu a dominá-lo: o fogo.
A minha avó afirmar que já não se lembrava de alguém viver aqui, mas que era do tempo dos mais velhos que ela. Desconfio que a pessoa que viveu aqui, teria sido alguém que tenha fugido á Guerra, nomeadamente á Primeira Guerra Mundial na qual Portugal participou.
Pormenor da entrada
Poucos metros mais abaixo, existe outra construção, que suponho que pertencia ao tal burro. È uma construção mais pobre, mais húmida e menos protegida. No entanto isso só reforça a minha ideia de que realmente tenha vivido mesmo aqui alguém.
Também convém salientar que da primeira vez que visitei este local, havia vestígios de restos de vinha abandonada assim como árvores de fruto. No entanto nunca houve relatos que esta zona tenha sido cultivada recentemente, o que só indica que alguém viveu aqui, muito provavelmente no inicio do sec.XX.
Pormenor da entrada para a casa do animal, o burro

No entanto mais acima, encontrei umas escrituras que não consegui decifrar, penso que não teriam significado algum, eram apenas uma espécie de inscrição na rocha em forma de uma ferradura de um cavalo. Não foi encontrado qualquer objecto que remetesse para época em questão, o que faz deste texto algo insignificante se objectivo for direccionado para a vertente puramente arqueológica.
No entanto o meu objectivo foi apenas dar a conhecer, não só o património geológico da nossa terra,  com magnificas cavernas embutidas nas rochas, mas também algo que já não se encontra nos dias de hoje, o Homem em busca da solidão, e encontro com a natureza, o bucolismo como é assim designado.

Ainda existem mais cavernas na região que espero poder explorar futuramente.

Talvez a nossa terra tenha mais histórias para nos contar do que aquelas que alguma vez imaginamos.


Texto e fotografia

Ricardo Ramos 

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Retrato de um paraíso a preto e branco

A aldeia de Canaveses foi uma das muitas vitimas dos incêndios que destruíram o pais, no passado mês de Agosto.
O Incêndio que se Consta que começara para os lados de Vale de Égua, chegou mesmo a colocar casas em perigo na aldeia do Cadouço.

O fogo chegou mesmo ameaçar algumas habitações 
Contraste de alguma vegetação verdejante 
Mesmo assim parece haver vida na destruição

terça-feira, 16 de julho de 2013

Igreja Canavezes

Foto: Elaine Martins 

A igreja de Canavezes é um templo de arquitectura românica, supõem-se que a sua a sua construção seja do século XIII, tal como a maior parte das igrejas de Trás-os-Montes de planta longitudinal com 1 nave contrafortada.

As igrejas desta região dependiam muito do quadro social, económico e político em que se desenvolveu como a região denominada; Trás-os-Montes que fora uma região pobre economicamente, dai não possuir grande variedade de técnica.

 É caracterizada pela robustez (dada pelas paredes grossas, pelos contrafortes salientes e pelo uso da pedra aparelhada); pela grande sobriedade e austeridade, a nível formal e decorativo, pela cobertura com um telhado de duas águas; pela utilização do arco de volta perfeita.

Foto: Célia Lopes
No interior o telhado era de madeira policromada com decoração mural neoclássica. A pintura do telhado interior chegava a ser pedagógica, encontrando-se ao serviço da religião, transmitindo os ensinamentos e os princípios fundamentais da doutrina cristã, assim com passagens da biblia, que desapareceram com as obras de restauro.As naves estão ligadas através de dois arcos de volta perfeita classicistas e, tal como o resto da igreja, estão revestidas por um lambril em azulejo. Sobre o portal principal encontra-se o coro, ao qual se pode aceder por uma escada junto à porta principal.



A igreja, símbolo da espiritualidade da época, poderia ter estado ligada a uma ordem religiosa a um padre mais concretamente. Supõem-se que tenha estado directamente ligada á casa centenária que hoje pertence ao Sr. José Canavezes, dai similaridade dos telhados trabalhados que existiram outrora.



Os materiais usados nas construções religiosas,  foram as existentes em cada região: no Norte do país foi empregue o granito; ao contrário do que o acontece no Centro, o calcário; e no Sul o tijolo e a taipa;

Supõem-se que já tenha sido mandada rectificar mais que uma vez, sendo que a ultima vez tenha sido pelo Sr. Toninho Valpaços.

Padre Ismael
Foto: Célia Lopes

O românico português possui características fortemente rurais e está ligado à construção de igrejas de reduzidas dimensões, que dependendo da região, se revestiam de maior ou menor qualidade técnica e exuberância formal e decorativa;

Espaço: Rural, não isolada, encontra-se em terreno nivelado, envolvida por casas de habitação, com proximidade do ribeiro. Possui adro lajeado e empedrado a cubo granítico.

De destacar um homem que fez muito por esta igreja doando as suas terras á igreja, Isac Moraes é o seu nome, cujo o seu nome ainda se encontra nas portas do átrio da igreja.
Também o trabalho e dedicação do Padre Domingos que foi pároco desta freguesia e serviu a sua população, um agradecimento da comunidade mais jovem.
E por ultimo e não menos importante o Padre Ismael, que é um padre natural da aldeia e filho da terra.

Padre Domingos

O padroeira desta freguesia Nossa Senhora do Ó e a Senhora da Especulação.


Na altura da festa religiosa, as romarias transformam a pequena igreja numa enorme catedral de fé. O Santo Padroeiro e a hospitalidade das pessoas desta aldeia olharão por si durante a sua visita.



NOTA: A informação publicada disponível sobre esta igreja é muito parca, de momento não disponho de mais informação sobre a igreja em si, tipo ano de construção, mas logo que oportuno serão actualizadas nesta página. Quem eventualmente dispuser dessa informação, agradeço contacto para o email do meu perfil. Desde já obrigado.

Ricardo Ramos

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Cerca dos Mouros - Canaveses


A Cerca dos Mouros, como é popularmente conhecida, é uma antiga fortificação situada na freguesia de Canaveses. Apesar do nome, esta estrutura não pertenceu aos mouros salvo, barberes, sendo na verdade, um castro construído em épocas anteriores.

Trata-se de um castro, de pequenas dimensões, localiza-se na transição entre o microclima da Terra Fria e da Terra Quente. A ocidente, o território é marcado pelos xistos e caracteriza-se pela maior pluviosidade e temperaturas mais baixas, típicas da Terra Fria. A oriente, o granito predomina, aproximando o clima da Terra Quente, com verões mais quentes, menor pluviosidade e invernos rigorosos (Pereira & Machado, 2020).

A fortificação combina muros de quartzo com muralhas naturais. De acordo com o mapa de Sanchez (2008), nas proximidades encontram-se outros locais de interesse arqueológico, como a mamoa do castelo e dos Burralheiros (monumentos megalíticos funerários), castro de Palheiros e cerca de 230 outros sítios arqueológicos que integram as estações da pré e proto-história, incluindo povoados, arte rupestre e abrigos.

A construção da designada Cerca dos Mouros remonta possivelmente à Idade do Ferro, que decorreu mais de 1000 anos antes de Cristo. Embora exista a possibilidade de ter sido reutilizada por outros povos, como os romanos, não há estudos arqueológicos que confirmem essa hipótese. Certo é que as paredes hoje em ruínas foram erguidas há muito tempo.

Vista aérea cerca dos mouros, através de software. créditos: Ricardo Ramos 2025


 No interior do castro, foram encontrados vestígios de cerâmica, possivelmente datados da Idade do Ferro ou do período de romanização, o que evidencia uma ocupação prolongada e significativa.

A localização da fortificação, no topo de um monte na fronteira entre as aldeias de Canaveses e Vale de Égua, oferecia uma defesa natural e um controlo tático sobre os campos envolventes. As formações rochosas e grandes calhaus funcionavam como muralha natural, reduzindo o esforço necessário para a construção. Perto da fortificação corre uma ribeira a norte, mas de grande declive desde a linha de água até ao castro, presumo que épocas mais remotas, possivel ter existido um estradão. 
Pormenor possível, através de software. Ricardo Ramos 2024



As habitações do castro são circulares, com diâmetros entre 5 a 8 metros, construídas em pedra.
Atualmente, o local encontra-se abandonado. Muitas das pedras da muralha foram levadas pelos habitantes das aldeias próximas para outros usos, o que dificultou a preservação da estrutura. Ainda assim, é possível perceber como a muralha protegia as pequenas habitações. Estima-se que a muralha, particularmente na parte oeste, teria uma altura considerável antes da pilhagem das pedras.



Reconstituição infiel do periodo Romano, através de software, Ricardo Ramos 2024 


Infelizmente, nunca foi realizado um estudo arqueológico no local. Existem relatos de habitantes locais encontraram artefactos antigos. Após o incêndio de 2012, a queima da vegetação revelou o sítio a detectoristas que pilharam o local. Moedas de baixo valor, algumas em mau estado, foram encontradas, incluindo exemplares com a imagem da loba capitolina com Rómulo e Remo.

O acesso à Cerca dos Mouros faz-se pela aldeia de Canaveses ou pela estrada 314, perto de Vale de Égua. Por Canaveses um estradão de terra batida leva até ao sopé do castro. A carta arqueológica do concelho de Valpaços não faz referência a este local. Após o incêndio, houve intervenções humanas, como a plantação de castanheiros e o desenvolvimento da apicultura, evidenciando a atividade agrícola crescente.

O local destaca-se pelas suas construções circulares e pela paisagem envolvente.  Apesar da sua importância histórica, a Cerca dos Mouros permanece sem a devida atenção científica e arqueológica, salvo este modesto artigo, que procura dar-lhe alguma visibilidade.


Ruínas do que resta da muralha da "Cerca dos Mouros" dá para ter ideia da grossura da muralha.


Paisagem Envolvente; vista do cimo da "Cerca dos Mouros"
No percurso para a Cerca dos Mouros somos acompanhados pelo Rio Lila que corre em direcção á aldeia, este proveniente do vale de Revides perto da aldeia do Castelo
Riacho




Muralha Natural









Carta arqueológica